Ações do governo expõem as contradições de Dilma durante campanha

Antônio Assis
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Leonardo Spinelli
JC Online

Presidente reeleita terá um mandato de muitas dificuldades

Lula Marques / Fotos Públicas

“O pessoal que lê jornal já sabia que a economia estava ruim. Mas para quem acorda às 5h para pegar um ônibus lotado, passa o dia todo trabalhando e volta pra casa na hora da novela – com pouco tempo para ficar com os filhos –, esse trabalhador só vai sentir o custo disso tudo quando o gerente de RH da empresa o chamar e dizer que vai botá-lo para fora porque as vendas caíram.” A frase do especialista em contas públicas Mansueto Almeida resume bem os fatores que levaram a presidente Dilma Rousseff à reeleição, mesmo diante de uma crise cujos efeitos já eram sentidos antes da campanha. 
Também dá a medida do problema que ela terá ao longo do seu segundo mandato. Sua campanha varreu para debaixo do tapete os problemas da gestão econômica do Brasil e defendeu um modelo de política que, ao invés de entregar inflação baixa, juros civilizados e crescimento sustentado, gerou justamente o oposto. Em menos de 30 dias de novo governo, tudo o que foi dito na campanha também virou pó a ser escondido. 
Os ajustes anunciados até agora pelo ministro da Fazenda Joaquim Levy poderão levar o País à recessão em 2015, o que trará impacto no emprego e perda para os trabalhadores. As primeiras ações do executivo são impopulares, apesar de necessárias, e atingiram o seguro-desemprego, abono salarial e pensões, através de medida provisória que vai passar pelo crivo de um Congresso mais resistente ao governo, seguidas de aumento de impostos sobre gasolina, movimentações financeiras, importações e no setor de cosméticos. A Caixa também anunciou aumento nos juros do financiamento da casa própria com recursos da poupança.
O resultado disso tudo já preocupa os partidários da presidente em relação às eleições municipais do ano que vem. Os petistas agora tentam isolá-la das decisões tomadas pelo seu ministro da Fazenda, afirmando que essa visão de política econômica de ajustes não combinaria com o pensamento do partido e da presidente. “Ajuste econômico não foi discutido na campanha, pois o eleitor gosta mesmo é de ouvir como o governo vai aumentar os gastos com saúde, segurança e educação. Mas ao omiti-lo, isso é uma coisa que pode irritar o eleitor, com razão”, avalia Mansueto.
Para recolocar a economia nos eixos, os ajustes vão exigir que os brasileiros paguem tributos e preços mais altos, principalmente de serviços administrados que passaram os últimos anos com preços controlados pelo governo, além de um custo maior para tomar crédito, de forma a desacelerar a pressão inflacionária. As vendas mais baixas poderão gerar desemprego. Estimativas apontam para uma inflação acima da meta este ano, na casa dos 6,67%, por conta dos preços administrados. Os economistas acreditam que esse custo é de curto prazo, no máximo até 2016, de forma a corrigir os erros. Um período maior de ajuste poderia ter um efeito contrário, pois um nível de desemprego alto por muito tempo acarreta em redução de renda, que impede o crescimento da economia.
O governo fechou 2014 com déficit primário de R$ 19,6 bilhões calculados até agora e, mantendo a mesma política de gastos, o Brasil estaria passível de perder o chamado grau de investimento, encarecendo o crédito para produção. A prática de jogar despesas de um ano para o outro, inclusive obrigatórias, se intensificou nos últimos dois anos. Auditoria do TCU diz que as pedaladas fiscais feriram a lei. O ministro Levy já disse que vai dar maior transparência às contas publicas, para ter de volta a credibilidade. É válido lembrar que o governo conseguiu mudar no Congresso as regras da política fiscal, permitindo descumprir, sem punição, a meta de poupança para pagamento de juros da dívida de 2014.

FIM DA NOVA MATRIZ
O déficit primário de cerca de R$ 20 bilhões registrados em 2014, só aumenta o tamanho do esforço que Joaquim Levy terá de implementar para chegar ao superávit primário de 1,2% do Produto Interno Bruto este ano (R$ 66,325 bilhões).
Dando início ao que o antigo ministro da Fazenda Guido Mantega batizou de “nova matriz econômica”, no dia 1º de maio de 2012, a presidente Dilma falou em cadeia de TV que iria reduzir os juros e reduzir o spread dos bancos. No ano seguinte, ela voltou em rede para dizer que iria reduzir a conta de energia, depois de ter lançado a Medida Provisória 579, que renovou o prazo de concessões de hidrelétricas e impôs preços de venda menores ao consumidor e indústria. O incentivo veio num período de baixa precipitação hidrológica. O resultado são os apagões, a iminência de um novo racionamento de energia e aumento na conta de luz que pode chegar este ano a 40% segundo especialistas.
A conta mais alta não chegou apenas para o consumidor. O próprio sistema elétrico brasileiro passa por dificuldades e o principal exemplo é a Eletrobrás, empresa líder em geração e transmissão de energia elétrica no País. Mesmo dominando o mercado fornecendo 34% da eletricidade consumida pelo brasileiro e responsável pela metade das linhas de transmissão, desde 2012 a empresa entrega prejuízos na casa dos R$ 6,5 bilhões ao ano. Antes da MP 579, em 2011, seu lucro foi de R$ 3,7 bilhões. A tarifa de energia do Brasil é uma das mais caras do mundo. 
“Infelizmente as coisas são camufladas. Bota a culpa em São Pedro, mas há falta total de planejamento do setor, por isso passamos por isso. A situação foi agravada com a MP 579”, afirma Agenor Oliveira, diretor da ONG Ilumina, organização que agrupa técnicos com larga experiência do setor energético. 
Outra importante companhia energética passa pelo seu pior momento. Pressionada por todos os lados, a Petrobras e seus consumidores não podem hoje desfrutar da baixa no preço do petróleo no mercado internacional (caiu dos US$ 100 ao patamar de US$ 50). Além disso, enfrenta uma série de denúncias na Operação Lava Jato. Tem também a responsabilidade de cumprir com um pesado programa de investimento para extrair petróleo das águas profundas do Pré Sal, num plano que envolve US$ 220,6 bilhões (R$ 570 bilhões, aproximadamente), enquanto patina numa dívida de R$ 300 bilhões. O governo também segurou o preço da gasolina para não repercutir na inflação. O tiro mais uma vez saiu pela culatra. “A contribuição que a Petrobrás poderia dar hoje para a queda da inflação não será possível”, diz Osvaldo Moraes, analista da Multinvest.

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