Faltam remédios e fornecedores na Farmácia do Estado

Antônio Assis
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Fabío Marques, pai de Diana, 11, precisou acionar o judiciário para obrigar o Estado a fornecer uma droga que custa R$ 3,5 milFoto: Flávio Japa

Renata Coutinho
Folha-PE

A crise dos medicamentos tem ganhado contornos de tragédia na saúde nos últimos meses, principalmente para pacientes com doenças raras. Em Pernambuco, a Farmácia do Estado vive com estoques baixos para várias drogas e o Ministério Público (MPPE) estima um débito de aproximadamente R$ 23 milhões com 13 fornecedores. No entanto, o rombo pode ser muito maior.

Uma reunião está marcada para dia 1 de novembro numa tentativa de contornar a situação e garantir assistência. Paralelo à ação do MPPE, a sociedade civil também se organiza para barrar ações em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF) que podem interromper o fornecimento de remédios de alto custo que não estão disponíveis na lista SUS e também de medicamentos não registrados na Anvisa. Para tanto, pacientes em várias capitais vão às ruas amanhã.

No Recife, a manifestação “STF, Minha Vida Não Tem Preço” se concentrará às 16h, no Marco Zero. “O STF enten­deu que os estados só devem pagar o medicamento que estiver registrado na Anvisa, mas a gente sabe que a Anvisa pode demorar muito para registrar uma droga”, justificou o presidente da Associação Pernambucana de Mucopolissacaridose (AMPS-PE), Fábio Marques.

Ele destacou que se for perdido o direito de buscar na Justiça os pagamentos de tratamento caros, sejam de drogas ainda não registradas na Anvisa, ou não incluídas no SUS, isso significará quase uma sentença de morte para muitos pacientes. Segundo ele, há pelo menos 13 milhões de brasileiros com alguma doença rara. “Muitos pacientes serão penalizados. Será muito triste.”

Pai de Diana, 11 anos, portadora de Mucopolissacaridose tipo IV - que provoca alteração de fígado, baço e rins-, ele conhece de perto essa batalha. Precisou acionar o judiciário para obrigar o Governo de Pernambuco a fornecer uma droga que custa R$ 3,5 mil para a filha. O preço é exorbitante, porque a criança precisa de seis ampolas por semana, ou seja, R$ 21 mil por semana são gastos com o tratamento.

A decisão do STF impactará diretamente, também, nos tratamentos com Canabidiol (CBD), droga derivada da maconha. A medicação que vem se popularizando nos cuidados de epilepsia de difícil controle não tem registro da Anvisa, muito menos está no rol do Sistema Único. Ela chega para pacientes que solicitam autorização para importação. Como cada seringa custa R$ 1,5 mil fora despesas com impostos, a grande maioria dos tratamentos acabam sendo pago pelas Secretarias de Saúde. “Isso é um absurdo. Essas ações só vão prejudicar ainda mais os nossos filhos. Vamos brigar em vão agora pelos nossos filhos?”, reclamou a presidente da Liga Canábica de Pernambuco, Elaine Cristina, 33 anos, mãe de João Pedro, de 5 anos, portador de uma malformação no cérebro, e que aguarda o deferimento judicial do CBD.

MPPE

Diante dos dramas diários de pessoas que buscam a Farmácia do Estado em busca de drogas de alto valor, como imunossupressores, remédios para hipertensão pulmonar, antibióticos, enzinas, entre outros garantidos pelo SUS, o MPPE já tem um inquérito civil instaurado há quase quatro anos. A ação vem tentando conhecer os motivos do desabastecimento do estoque de vários remédios.

No último mês, a promotoria identificou a falta de 70% dos itens da farmácia. Na última sexta (14), a promotora Ivana Botelho apontou que isso deve ser reflexo de débitos milionários da Secretária de Saúde com fornecedores. “Eu não tinha ideia do montante, mas imaginava que havia débitos porque as licitações da secretaria estavam dando desertas. Qual a razão para os fornecedores não quererem vender para o Estado?”, questionou. O Ministério Público notificou 20 empresas fornecedoras para buscar esclarecimentos. Destas 16 enviaram respostas, sendo que três negaram pendências financeiras. Treze apontaram débitos que juntos somam mais de R$ 23 milhões. Apenas uma empresa teve prejuízo é de R$ 10 milhões.

Governo

A Secretária Estadual de Saúde (SES), em nota, informou que vem trabalhando junto com a Procuradoria Geral do Estado para agilizar a compra de medicamentos, assim como elaborando cronogramas indicando a prioridade de aquisição. O órgão alega que tem mantido diálogo permanente com as empresas para sanar os débitos ou evitar atrasos nas entregas. A pasta disse ainda que monitora o estoque para que não haja descontinuidade do tratamento dos pacientes. O desabastecimento de alguns produtos é causado por diversos fatores, que vão desde o atraso na entrega por parte de distribuidores de medicamentos, que descumprem acordos com a SES, até a demora para a conclusão de licitações, devido ao esvaziamento de processos por parte das empresas.

A assistência farmacêutica atende 39 mil pessoas com uma lista de 235 tipos de medicamentos padronizados pelo Ministério da Saúde. Com relação aos mandados judiciais, foi criado, em 2014, um Núcleo de Ações Judiciais dentro da SES. Naquele ano, o Estado gastou cerca de R$ 64 milhões para cumprir ordens judiciais referentes à aquisição de medicamentos não cobertos pelo SUS. Foram 1.407 ações judiciais, sendo 1.082 relativas apenas a medicamentos. A pasta não informou os dados de 2015, nem 2016.

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