Campos e as faces da vitória

Antônio Assis
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Por Ivan Maurício, jornalista, ex-secretário de Imprensa de Pernambuco, primeiro presidente do PSB local e coordenador da campanha de Antônio Campos

As recentes eleições no Brasil, mais uma vez, vieram demonstrar o quanto, em muitos cenários, a realidade parece imitar a ficção, e não o contrário, como é mais frequente. O caso da disputa em Olinda foi um dos que mais despertaram a atenção do país, pois apresentou ingredientes que se encontram em obras de teatro e em romances. Do começo ao fim.

O irmão de um ex-governador (que foi candidato a presidente da República e morreu num acidente trágico) lança-se candidato a prefeito de uma Cidade Patrimônio da Humanidade. O lógico seria receber o apoio irrestrito e maciço do seu partido e de toda a sua família (incluída a viúva do seu irmão), mas ocorreu o contrário.

O advogado e escritor Antônio Campos teve de provar, na sua estreia como candidato a um cargo público e majoritário um gosto amargo, não o da derrota, mas daquelas verdades do evangelho de S. Mateus: “os inimigos do homem serão os da sua própria família” (cap. 10, vers. 36); e das palavras de Adenauer: “Há três tipos de inimigos: os inimigos simples, os inimigos mortais e os companheiros de partido”.

Os gregos antigos, na sua imensa sabedoria, fizeram com que a deusa da Vitória fosse irmanada a Potestas (o poder socialmente reconhecido) e a Invidia (que personificava ao mesmo tempo a Inveja e o Ciúme). Quem quiser provar os ricos sabores do sucesso tem de estar atento a isso. Seja na luta política, seja em qualquer outra atividade humana. Há êxitos que ocultam futuros fiascos e determinados insucessos que prenunciam vitórias adiante, e, até mesmo, já nascem com jeito de vitória.

Mesmo os que não simpatizam com Antônio Campos reconhecem que ele conseguiu sair da sua primeira batalha eleitoral muito mais forte. Agora é respeitado não somente como um líder na área cultural, mas na política também, e ninguém se surpreenderá quando essa liderança extrapolar a província. Abertas as urnas, apurados os votos, serenados os ânimos, vale atentar para as sábias palavras do escritor José Saramago: “A derrota tem algo de positivo: nunca é definitiva. Por outro lado, a vitória tem algo de negativo: jamais é definitiva”.

Quem tomou conhecimento das entrevistas e declarações de Campos, após a eleição, num balanço do cenário local (que refletiu em alguns aspectos o nacional), notou o quanto também amadureceu o homem público que ele é por vocação natural – com exemplos famosos, além do irmão, Eduardo, o avô Miguel Arraes. É como se ele incorporasse à sua própria vida aquela frase tão sábia que atribuída a Buda: “Nem mesmo um deus pode transformar em derrota a vitória de alguém que venceu a si”. A confiança recebida de quase cem mil pessoas, moradoras de uma cidade sofrida e gloriosa como Olinda é algo de que poucos podem se orgulhar.

Numa democracia ainda em aperfeiçoamento como a do Brasil é necessária a prudência (e a humildade) de olhar além das batalhas eleitorais. Até para a situação global, na atualidade, que, sob certos aspectos, se mostra muito mais cheia de extremismos do que a do século XX que foi cognominado pelo historiador Hobsbawm como a Era dos Extremos.

Viver é aquela luta renhida a que se referiu há muito o poeta. Uma eleição é somente uma parte muito modesta da vida. Vencer não é somente contar votos e curvar-se aos aplausos. 

É também resistir. Novas lideranças são urgentes num Brasil em que o ceticismo e o desencanto com a política e os políticos ficaram evidentes nestas eleições, não somente por causa do número das abstenções e os votos nulos e brancos, mas por certas escolhas que são apostas em interrogações e reticências. O chamado antissistema. Mais do que nunca é necessário delimitar bem os campos.

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