Morador de Rio Doce ajuda a construir casas com reciclados

Antônio Assis
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Sebastião Pereira Duque aposta na reforma de barracos de moradores da comunidade. Foto: Anderson Freire/ DP

Marcionila Teixeira
Diário de Pernambuco

Quando Sebastião completou quatro anos, já não tinha pai e mãe. Era a representação clássica de uma criança órfã, pobre e sem muitas alternativas de sobrevivência. Restaram para ele a companhia dos porcos, dos bodes e o trabalho na roça. Assim foi até completar 17 anos, parte deles vividos com roupas em farrapos e sono repartido com os animais que ajudava a criar na casa de parentes, no interior da Paraíba. Sebastião Pereira Duque, 61 anos, sobreviveu. Tornou-se quase imbatível.

No bairro de Rio Doce, em Olinda, onde vive, montou uma escola para crianças pobres. A Nova Esperança deslanchou e Bastião agora aposta na reforma de barracos de moradores da comunidade. Para seu empreendimento dar certo, ele precisa de madeira. E ela pode estar por perto, como se lixo fosse. Manipulada com sabedoria, é capaz de levar um pouco de conforto à população que vive suspensa em palafitas na beira do mangue.

Desde o final do ano passado, Bastião já conseguiu reerguer oito barracos, sendo um de tijolos e sete de madeira, na Vila Nossa Senhora Aparecida, na segunda etapa de Rio Doce. Tudo com a ajuda de doações ou material encontrado nas águas do mangue. Para quem mora em um imóvel com boa estrutura, Bastião parece estar fazendo algo inócuo. Não é bem assim. 

Apesar da aparência simples, o barraco fica mais habitável e menos sujeito à inundação das águas do mangue. Angélica Alves, 27, por exemplo, perdeu tudo após as enchentes deste ano. Pediu ajuda a Bastião e ele atendeu. “Juntamos um bocado de móveis jogados fora por um comerciante do bairro depois que foram molhados pelas chuvas e fizemos o barraco dela. Lá ela vive com três crianças, sendo uma deficiente”, lembra.

Para reconstruir um barraco, Bastião precisa de, no mínimo, 20 telhas, além de tábuas e pregos. “Tá vendo essa porta? Ela parece estragada. Mas serve para ser colocada em uma casa. Essa eu achei no lixo”, conta, satisfeito. Junto com a porta abandonada, existem telhas do tipo Brasilit e infindáveis tipos de materiais recicláveis. “As pessoas ainda não estão preparadas para separar o material e levar para Sebastião”, lamenta. Depois de reformado, o barraco fica com dois vãos, com um total de 20 metros, sendo quatro metros de largura por quatro metros de comprimento. O custo da reforma é zero para o morador.

O pobre construtor não tem luxo. Dorme em um canto da escola, no mesmo lugar onde deposita restos encontrados no lixo. Lá recebe a demanda da população ainda mais pobre que ele. Pedem madeira. Mas, principalmente, comida para os filhos famintos. No dia da entrevista, a desempregada Maria da Silva, mãe de dois filhos pequenos, esperava um auxílio do paraibano. “Ele gosta muito de ajudar as pessoas. Sempre tem alguma coisa para nos dar”, fala a mulher, acompanhada das crianças e de uma caixa repleta de alimentos.

As doações de comida, Bastião consegue em um supermercado próximo. Às vezes os iogurtes foram separados ou furados pelos clientes, as latas de refrigerante findaram descascadas ou amassadas e os sacos de arroz e feijão, furados. “Recebo esse material e repasso para quem precisa e me procura”, confessa o pedreiro dos pobres.

A Nova Esperança, cuja mensalidade é R$ 25 e atende hoje 70 crianças entre dois e cinco anos, não dá lucro, diz ele. “O que entra é para pagar as duas professoras, além das contas de luz e água”. Bastião está sempre com as portas de sua casa-escola abertas para receber qualquer tipo de doação e reciclável. Fica na Rua Cinco, 72, na segunda etapa de Rio Doce. Da solidariedade e dos achados no mangue tira o poder de ajudar os outros. E sua própria sobrevivência. Quem quiser ajudar pode ligar para 98776.1023.

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