Caixa 2 no centro do debate, entre a punição e a anistia

Antônio Assis
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Discussão é sobre punição e anistia à prática do caixa 2

JC Online

O medo de ter o nome escrito nas páginas da delação do fim do mundo emudeceu políticos, que vivem a expectativa de saber o conteúdo da "lista de Janot". Ao passo que a situação vai se agravando, prevalece a tática do "salve-se quem puder". É nessa caldeira que fervem em fogo alto projetos que propõem a anistia da prática do caixa 2, apesar de nenhum político ir a público defender a proposta. A investigação da Lava Jato e o encaminhamento dos inquéritos do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, para o Supremo Tribunal Federal 

"Estão levantando muita polêmica sobre a questão do caixa 2, quando na verdade a Lava Jato não está lidando com isso, mas com corrupção. A intenção é mudar o foco para gerar uma cortina de fumaça", observa a procuradora eleitoral Silvana Battini, professora da FGV Rio. Em coletiva semana passada, os coordenadores da força-tarefa defenderam que as discussões sobre anistia servem para ludibriar o debate acerca da lavagem de dinheiro. A fala é vista como resposta aos que querem colocá-lo como algo menor.

Na última semana, fervilharam declarações de autoridades minimizando a gravidade do crime eleitoral, ao passo que a Lava Jato fez proliferar acusações de operações milionárias de caixa 2 - que são repasses fora da contabilidade oficial - contra os mais diversos políticos e partidos. Uma das vozes mais experientes da Câmara, Jarbas Vasconcelos (PMDB) defende que discutir anistia ao caixa 2 desmoraliza a Lava Jato e o Parlamento. "Falar nisso é um suicídio coletivo do Congresso. Seria um desastre. E na política um passo em falso como esse dificilmente se recupera", disse.

A tentativa dos congressistas de passar uma borracha nesse tipo de delito é antiga. Em novembro do ano passado deputados tentaram incluir no projeto Dez Medidas Contra a Corrupção um artigo que previa a anistia para quem tivesse cometido o crime. Na prática, o adendo desfigurava o projeto original, proposto pelo Ministério Público Federal, que visa justamente coibir a conduta. À época, após a repercussão negativa da manobra, os parlamentares recuaram.

"Quando você omite esse recurso ou é porque quem está doando pediu para doar escondido ou quem está recebendo preferiu não declarar. Mas há algo errado na origem ou na destinação do recurso. Se é um dinheiro que a empresa vai doar e não quer contabilizar, é sonegação fiscal. Se o sujeito vai arrecadar sem declarar é porque vai usar para algo ilegal, como compra de voto ou enriquecimento ilícito", explica Silvana Battini.

O termo caixa 2 veio à tona em 2005, quando eclodiu o escândalo do Mensalão. A tese de "crime menor" foi usada de forma unificada pelos réus, mas rechaçada pelo STF.

FALTA PUNIÇÃO

O ponto nevrálgico da transgressão é que a prática fere o princípio da transparência e da isonomia da eleição. Pelo artigo 350 do Código Eleitoral, é crime "omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, para fins eleitorais??.

À frente da presidência da comissão de combate à corrupção da OAB, o advogado Fernando Araújo critica a falta de punição para o caixa 2 e defende o aprofundamento das investigações nos crimes que orbitam em torno dele, como enriquecimento ilícito e corrupção. "A anistia é algo que tem que ser usado em último recurso, mas não para esses casos. É um desserviço e mau exemplo que se dá sobretudo para as futuras gerações", grifa. Quanto à falta de fiscalização, Araújo avalia que a segunda lista de Janot pode avançar neste sentido, ao trazer o caixa 2 como crime e não atrelado a outros casos.

No esteio da reação dos políticos, a Justiça colocou até mesmo o caixa 1 sob investigação, quando o STF decidiu tornar réu o senador Valdir Raupp (PMDB-RO). A acusação é que ele recebeu propina como doação legal. O caso assustou políticos e iniciou nova discussão.

RIGIDEZ DA LEI

Para o publicitário José Nivaldo Júnior, que atua em campanhas políticas desde a década de 60, a origem do vício está na legislação. "Quanto mais restritiva, mais vai ser descumprida e mais vai gerar práticas aprimoradas de crime. A exemplo do que aconteceu no governo do PT recentemente, onde o partido se considerava dono do Estado, então criou mecanismo para saqueá-lo, para colocar empresas públicas a serviço da atividade política." Ele observa ainda pequenos delitos cotidianos dentro da sociedade, no caso da sonegação de impostos. "Isso se generalizou na sociedade. Muita gente acha que por ter recebido salário e ter pago os impostos não precisa fazer mais nada. Mas, no momento em que você não exige recibo, você está estimulando sonegação e o caixa 2", pontua.

O publicitário é categórico e pontua que o uso de caixa 2 em campanha se aplica a todos os políticos. "Se o cara cumprir tudo o que a lei diz ele não faz campanha", afirma.

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