Juiz venezuelano vive como refugiado no Recife

Antônio Assis
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Belandria aguarda resposta de emprego no Brasil enquanto espera fim da crise na Venezuela
Foto: Ricardo B. Labastier/JC Imagem

JC Online

Na semana passada, a Venezuela tomou conta mais uma vez as manchetes com a notícia de que o Supremo daquele país assumiu as funções do parlamento, de maioria oposicionista ao governo de Nicolás Maduro. Foi esse cenário complicado de relação entre os poderes que fez com que o juiz Jose Ali Pernia Belandria decidisse abandonar o cargo e hoje vive como refugiado no Recife. A família vendeu tudo o que tinha - dois carros, um apartamento e um terreno - para custear as passagens para o Brasil. Isso depois de enfrentar pressões e perseguições por parte do governo. Foi a falta de condições de trabalho que o fez sair do seu país.

Belandria atuava como juiz no estado de Merida. Ele ingressou no judiciário venezuelano em 1989, através de um concurso e atuou como magistrado até 2002, quando começaram as primeiras pressões do governo, ainda na era de Hugo Chávez. Depois de três meses afastado do cargo, a pedido, reconsiderou retomar a função a convite de um amigo, também magistrado. Mas as pressões retornaram ele desistiu da magistratura em 2007.

“Chegou um momento que não aguentei a pressão. Se chegou a um problema grave, porque perdi minha independência judicial. No momento em que me afastei, estava começando essa pressão. Eu me afastei do cargo de juiz por prevenção. Se eu ficasse, iam tentar fazer com que eu apoiasse a violação os direitos humanos”, disse. As perseguições, informa o ex-juiz, começaram no governo de Chávez, mas se intensificaram na gestão de Maduro.

A primeira forma de pressão, denuncia, é a existência de grupos de fiscais do governo, comparado pelo ex-magistrado ao que Hitler praticou na Alemanha nazista. “Não se respeita mais um sistema que existia de distribuição aleatória de causas”, relatou. “Não existe independência, não existe separação de governo. Outra coisa que está ocorrendo na Venezuela é que as ordens judiciais para libertar presos políticos não são cumpridas. Quando se emite uma ordem de libertar, deveria ser cumprida imediatamente, o que não ocorre”, acrescentou.

Após largar a toga, começou a atuar como advogado. Mas as pressões não pararam. “Ser advogado na Venezuela neste momento é muito difícil. É como Davi contra Golias. Se está defendendo pessoas contrárias ao governo, os advogados também são perseguidos. São acusados de lavagem de dinheiro. O governo acusa que o dinheiro que os clientes pagam aos advogados é ilícito. Também pode ser acionado de maneira criminal”, denunciou.

A reportagem do JC entrou em contato com a Embaixada da Venezuela, em Brasília, buscando informações sobre a possível perseguição a magistrados, mas não obteve resposta.
JUDICIÁRIO

Para Belandria, o “golpe de Estado” começou a se consolidar em dezembro de 2015, quando Maduro perdeu as eleições parlamentares e a maioria eleita é da oposição. Depois de duas semanas, afirma o ex-juiz, iniciou-se a nomeação dos magistrados que assinaram a sentença que culminou na anulação dos poderes do parlamento. Desde que Chávez chegou ao poder, em 1998, até a eleição de 2015, o governo dominava o Legislativo. A partir de janeiro de 2016, o Congresso começou a votar contrário a propostas governistas, que eram anuladas.

Belandria acredita que o governo de Maduro está cada vez mais fraco. Como exemplo, citou a declaração contrária às sentenças de anulação dos poderes do Legislativo feita pela Fiscal Geral da República, Luisa Ortega Díaz, chavista, onde ela convocou “caminhos democráticos”. “Ela surpreendeu a todos na Venezuela e no mundo porque deu essas declarações. Agora, estamos esperando a opinião dos militares. Se o comando militar diz o mesmo que Ortega, isso significa que acaba o governo de Maduro”, opinou.

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