Da capacitação profissional ao 'zap', idosos aderem à revolução digital

Antônio Assis
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Ana Tereza Moraes
JC Online

Quando o mercado de trabalho apontou que seu suposto “prazo de validade” havia chegado, Juraci Gutierres, 75 anos, não se rendeu à aceitação de que não tinha mais idade para o mundo moderno. Inconformada, buscou se reinventar: fez desde cursos de informática e redes sociais, até uma pós-graduação em Gerontologia (estudo do envelhecimento humano) que achou através de pesquisas na internet. Hoje, com o poder do conhecimento digital que adquiriu, leva a vida tocando um blog, o Viva a Velhice, e se define como “ativista do envelhecimento”.

Histórias como a de Juraci têm se tornado mais comuns do que se imagina. Com a tecnologia marcando presença em cada vez mais aspectos do dia a dia dos brasileiros, muitos idosos rejeitam rótulos de “ultrapassados” ou “atrasados” quando o assunto é internet e buscam se atualizar diante da era digital.

É o que mostra a pesquisa do Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação, a qual aponta que o número de pessoas com mais de 60 anos que usam a web passou de 8% para 19% entre 2012 e 2016. Já de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia Estatística (IBGE), o Brasil possui 30 milhões de idosos (acima de 60 anos). Entre eles, 60,9% conta com um celular para uso próprio e 24,7% costuma acessar a internet.

Muito além de simplesmente tirar foto dos netos, ligar para os filhos ou compartilhar correntes no WhatsApp, a nova geração de idosos incorpora a internet na rotina das mais variadas formas: na carreira, no lazer, para se informar ou descobrir novos hobbies.

“Tecnologia é informação. A gente tem que saber usar. As redes sociais e tudo que é internet são fundamentais hoje em dia”, afirma Juraci. “Na aula, por exemplo, a professora comentou sobre a dificuldade que temos de identificar se as notícias que recebemos são falsas ou verdadeiras, uma questão muito importante e atual”, comentou, referindo-se a oficina de WhatsApp para idosos a qual compareceu, ministrada por Cláudia Silveira no Festival Rec n’ Play 2018.

Inclusão digital da terceira idade

Para suprir a necessidade desse novo perfil em ascensão e incentivar a inclusão digital da terceira idade, Cacilda Medeiros, gerente da Pessoa Idosa da Prefeitura do Recife, destaca que a pasta oferece cursos e encontros sobre tecnologia – entre eles, o realizado no festival –, todos voltados para pessoas acima de 60 anos, como parte do projeto Navegar é Preciso. De acordo com as secretarias de Desenvolvimento Social, Juventude, Políticas sobre Drogas e Direitos Humanos e secretaria de Educação do Recife – à frente do projeto, criado em 2014 – cerca de 400 idosos já participaram das aulas.

“Promovemos o contato dessas pessoas com a tecnologia, desde a informática básica até as redes sociais. A gente vê depoimentos maravilhosos ao fim dos cursos. Por exemplo, já ouvi relatos de uma senhora que virou síndica do prédio e melhorou sua organização após um curso de Excel básico. Outros contam que agora conseguem organizar os grupos de igreja através do WhatsApp, ou revendem produtos de beleza e aprenderam a usar as redes sociais para divulgar isso e se comunicar com clientes”, conta Cacilda.

Zulemar Maria da Silva foi uma das beneficiadas de cursos como estes. Pouco adepta à tecnologia até então, estava ficando difícil para a corretora de imóveis de 65 anos exercer sua profissão sem estar conectada. “Tenho um escritório mobiliário e meu filho que ficava responsável pelo contato com o cliente, mas, diante da cobrança que eu recebo dos meus clientes para entrarem em contato diretamente comigo, resolvi ficar mais conectada para poder me comunicar melhor com eles”, conta.

Para isso, a primeira atitude de Zulemar foi aprender a usar um smartphone com internet, já que antes seu celular era de um modelo simples, sem conectividade. Em seguida, optou por buscar conhecimento em cursos e oficinas sobre WhatsApp, para garantir maior autonomia. “Tenho meus filhos, mas não ocupo eles pedindo esse tipo de coisa, porque eles têm as atividades deles e os horários muitas vezes não combinam. Mas estou disposta a aprender do jeito que for”, garante. Os novos conhecimentos têm ajudado na comunicação até mesmo com sua família, ressalta a corretora: “Agora vou poder mandar mensagens para os meus familiares que moram longe e tirar fotos dos meus netos para compartilhar, gostei muito disso”.

Casos como esses mostram que ultrapassadas não são pessoas da terceira idade, mas sim a ideia de que a capacidade dos mais velhos se renovarem ficou presa no passado. O novo perfil de idosos conectados já não se prende a mentalidade de “no meu tempo...”, pois entendem que o tempo deles também é agora, e que nunca é tarde demais para se reinventar e aprender coisas novas.

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