Thulio Falcão
Folha-PE
O bloqueio do WhatsApp no Brasil por 72 horas, mas suspenso ainda na terça-feira (3), retoma a discussão sobre privacidade. Nos últimos meses, o governo americano e a Apple travaram uma batalha sobre as informações contidas no iPhone 5C de Syed Farook, responsável por um ataque terrorista na Califórnia, no ano passado, que deixou 14 pessoas mortas. O FBI pagou mais de US$ 1 milhão para hackers invadirem o dispositivo do suspeito. Segundo James Comey, diretor da agência, o investimento “valeu a pena”, embora nada relevante tenha sido encontrado.
Tanto a Apple quanto o WhatsApp utilizam criptografia. Mas, no Brasil, a situação chegou a ser ainda mais extrema. Mais de 100 milhões de usuários foram prejudicados pelo bloqueio do serviço. A empresa emitiu nota, na segunda, afirmando que não pode entregar “informações que afirmamos repetidamente que nós não temos”.
A criptografia de ponta a ponta utilizada pelo WhatsApp permite apenas que o emissor e receptor da mensagem saibam o teor dela. As conversas são enviadas para os servidores do Facebook, em Palo Alto, cidade na Califórnia. Cada indivíduo conta com uma chave especial necessária para descriptografar o conteúdo enviado e recebido. “Quando criptografada a mensagem, o Facebook não tem como descriptografar”, ressalta o consultor de tendências do Porto Digital, Jacques Barcia.
O WhatsApp ainda possui uma tela para “Confirmar código de segurança”. Cada usuário possui um código único em forma de QR code ou uma sequência de 60 dígitos. Ele serve para confirmar que todo o conteúdo produzido no aplicativo - seja mensagens, fotos ou chamadas - estarão criptografados de ponta-a-ponta em cada uma delas. De acordo com o mensageiro, o processo é opcional.
Jacques explica que, embora o Facebook tenha escritório no Brasil, seria preciso acionar a justiça americana para conseguir as informações, já que a sede da empresa está instalada nos Estados Unidos. Para ele, uma solução seria criar sanções, como multas. “O princípio da neutralidade da rede, dentro do Marco Civil, prevê que o mensageiro ( o aplicativo) não pode ser o culpado. E isso não é observado pela Justiça. A internet é um serviço essencial e você não vê a interrupção de fornecimento de água quando uma empresa é acusada de algum crime, por exemplo”, critica.
Crimes
Para o delegado da Delegacia de Crimes Cibernéticos de Pernambuco, Derivaldo Falcão, o WhatsApp deve criar soluções para a entrega de informações que possam ajudar nas investigações da polícia. “Hoje, tráfico de drogas e outros crimes são organizados pelo WhatsApp. Uma vez que as investigações demandam o conteúdo trocado no aplicativo, a plataforma se negar irá gerar mais situações como estas (bloqueio)”.
Mas, em algumas situações, a polícia tem acesso às mensagens do WhatsApp. Em São Paulo, duas irmãs criaram um grupo no aplicativo para planejar um assalto ao próprio pai. O caso aconteceu no fim de março, mas só foi divulgado na semana passada. O esquema só foi descoberto após a apreensão dos aparelhos. “É necessário a apreensão desses materiais para que tenhamos acesso a esses dados nas investigações”, disse Derivaldo Falcão, quando questionado sobre a importância do acesso aos smartphones de suspeitos investigados.