Internas da Funase têm rara segunda chance de inserção social

Antônio Assis
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Clara foi a primeira interna selecionada para ser aprendiz. Ela foi treinada para fazer um trabalho administrativo e vem recebendo elogios pelo que vem fazendo
Foto: Alfeu Tavares

Paulo Trigueiro
Folha-PE

Há um ano e oito meses na Funase, Clara*, 19, já fez um curso de Turismo com duração de seis meses, outro sobre como responder a uma entrevista e um terceiro sobre empreendimentos. Desde janeiro, foi selecionada como jovem aprendiz na Compesa, trabalho que lhe rende meio salário mínimo mensal. Voluntariamente. Também conseguiu estudar todo o Ensino Fundamental e, atualmente, cursa o 1º ano do Ensino Médio. Quando cumprir sua pena de medida socioeducativa, não pretende voltar para o Interior, onde morava sozinha desde os 14 anos e de onde foi transferida aos 17 após cometer um crime. 

A oportunidade de inserção no mercado de trabalho faz diferença quando o assunto é a ressocialização e, consequentemente, tem impacto no índice da reincidência de atitudes criminosas. Mas ela é rara. A vaga na Compesa que Clara ocupa surge de uma parceria realizada com a Funase. “O sistema precisa ter mais apoio de empresas para termos mais oportunidades para essas meninas. Ainda há preconceito a ser desmistificado porque muitas querem seguir uma carreira honesta e não encontram vagas”, afirmou o advogado do Case Santa Luzia, Marcos Morais. 

Roberta*, 17, preencheu a segunda vaga de jovem aprendiz que a Funase conseguiu garantir realizando parceria com a Associação do Ministério Público de Pernambuco.

A partir dos 11 ela começou a usar e comercializar drogas, logo quando as coisas começaram a mudar na vida doméstica. O pai, a quem ela era apegada, se preparava para deixar a casa e família. “Era uma vida errada, mas eu fui sincera quando me procuraram para ver se eu tinha interesse em não voltar a ela. Fui selecionada e descobri que sou muito rápida e eficiente no trabalho administrativo que realizo. Quando fui escolhida, senti algo muito diferente. Minha mãe sempre chorou de tristeza por minha causa. Dessa vez, foi de alegria. Eu quero isso, antes ganhava muito dinheiro em um dia, mas corria risco de ser presa ou morrer. Agora quero meu dinheiro pouco e suado”, comentou a adolescente, que já havia feito um curso voltado para o trabalho administrativo pago pela mãe, que trabalha como faxineira. Tanto Roberta quanto Clara têm recebido elogios quanto à relação interpessoal e à eficiência, de acordo com monitores do Centro.

No Case Santa Luzia, as duas e outras 24 jovens do sexo feminino ocupam o espaço destinado a apenas 20. Já houve 60 ali dentro. É o único de Pernambuco. “Há pessoas de culturas e idades muito diferentes que passam por aqui. E precisamos devolver para a sociedade uma pessoa melhor do que entrou. Mas é difícil sem as oportunidades”, avaliou a coordenadora técnica do Case, Jailda Castro. 

“Trabalhamos a questão do vínculo com a família. Mas, nas visitas domiciliares, vemos situações complicadas de miserabilidade.”

Em geral, as famílias são compostas por uma mulher - mãe ou avó - que toma conta de vários filhos ou netos. “Muitas vezes não há uma panela no fogão. Muitas vezes encontramos indícios de abusos e denunciamos para que sejam investigados. 

Chegamos a não devolver a pessoa para a família e utilizarmos medidas protetivas”, explicou Castro. “Sem as oportunidades de cursos, lazer e trabalho, fica ainda mais complicado.”

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