Foto: Nélson Almeida/AFP
Júlia Dias Carneiro
BBC Brasil no Rio de Janeiro
A população brasileira está "cada vez mais indignada" com os sucessivos escândalos de corrupção e a crise política que atingiu o presidente Michel Temer, mas essa indignação, em vez de se canalizar em um "grito de basta" suficientemente forte para promover mudanças, vem se traduzindo em "desolação, apatia, conformismo", considera o sociólogo Sérgio Abranches.
"As pessoas das mais variadas procedências estão dizendo 'não tem jeito', 'eu quero ir embora'. Essa é a pior reação", opina Abranches. "Eu gostaria de ver uma explosão social, gostaria de ver o povo na rua, completamente indignado, não aparelhado, realmente disposto a ir às últimas consequências, se necessário, para mudar a situação."
O sociólogo de 67 anos acha ser necessária uma "ruptura" para restabelecer a representatividade política, uma reação popular desgarrada das "velhas estruturas partidárias".
"Não estou defendendo a baderna. Mas essa (a mobilização social) é uma das poucas saídas que vejo para mudanças mais radicais no Brasil", diz à BBC Brasil em sua casa no Rio de Janeiro.
Autor do recém-lançado livro A era do imprevisto: A Grande Transição do Século 21 (Companhia das Letras, 2017) e colunista da rádio CBN, Abranches considera que o governo Temer não tem mais salvação após a crise deflagrada pelas delações da JBS e acha que o presidente comete um "segundo crime de responsabilidade" ao prolongar sua permanência no poder.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista.
BBC Brasil - A crise explodiu de um dia para o outro, mas não está claro se ela irá se resolver em um espaço de semanas ou meses. Que duração essa crise está se desenhando para ter?
Sérgio Abranches - Acho muito pouco provável que vá até as eleições de 2018. A Presidência Temer vai terminar antes disso. No curto prazo, você teria uma solução mais rápida que já foi descartada por Temer, a renúncia. Essa seria a forma mais rápida, eficaz e indolor de colocar o país de volta nos trilhos, mas já foi descartada.
Ao decidir resistir, na minha opinião, ele cometeu o segundo crime de responsabilidade, porque isso vai custar caro ao país, a ele e ao orçamento público.
BBC Brasil - O que o senhor chama de "segundo crime de responsabilidade"?
Abranches - Ele decidiu ficar sabendo que para tal terá que fazer mais concessões, incorrer em gastos públicos e contratações espúrias simplesmente para sobreviver, e comprar o apoio do Congresso. Há uma possibilidade de ele ainda fazer uma saída honrosa, que é aceitar o veredito do Tribunal Superior Eleitoral (TSE, que julga supostas irregularidades de campanha na chapa Dilma-Temer em 2014) e decidir não recorrer.